Confira uma análise sobre os caminhos e a integração dos ecossistemas tecnológicos de SalesTechs e MarTechs
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Explorada a jornada de transformação digital das áreas de marketing e vendas no ambiente empresarial brasileiro, é hora de entendermos um pouco mais sobre os desafios das salestechs e martechs dentro deste processo de abertura do mercado, analisando de que modo elas enxergam a própria maturidade do ecossistema de inovação nacional voltado para as rotinas de business performance e como elas vem contribuindo para uma mudança de mentalidade de profissionais e líderes do setor.
Neste sentido, é interessante, antes de tudo, dimensionarmos um panorama global do crescimento das salestechs e martechs.
Sobre este ponto, um relatório do LinkedIn de 2020 abrangendo o mercado americano de vendas apontou, dentre outros indicadores, uma maior adesão por parte das empresas em relação às novas tecnologias – questão esta que tem sido acelerada pela crise do COVID-19 e que abre oportunidades para salestechs que forneçam maior inteligência para os times de venda.
O relatório indica, por exemplo, que nos últimos dois anos, o uso de ferramentas de sales intelligence cresceu de 28% para 43% nas organizações; ao passo que 77% dos vendedores estão investindo em vendas e reuniões virtuais e outros 51% já utilizam dados para um aumento da performance de vendas.
Pensando na área de marketing, a indústria de tecnologias voltada para o setor atingiu US$ 121 bilhões em investimentos globais segundo a Statisa, com mais de 8 mil soluções disponíveis em todo o mundo, o que representa um avanço expressivo de 22% em relação ao ano de 2018 e um consequente processo de digitalização das áreas de marketing– tanto levando em conta o uso de soluções tradicionais do mercado de tecnologia, quanto de startups. Em contrapartida, o avanço da digitalização das áreas de venda começa a engrenar não só em mercados mais maduros, mas de modo global.
Alguns dados relevantes podem ser listados para um melhor entendimento deste cenário. No campo da entrega de resultados, por exemplo, o mercado de softwares para a gestão da performance de vendas deve atingir US$ 1,35 bilhões em investimentos também segundo a Statista. Além disso, quando analisamos o mercado das pequenas e médias empresas, é interessante perceber, por exemplo, que novos negócios, com menos de 10 anos de mercado, tem direcionado mais esforços na aquisição de novas tecnologias, sendo estas empresas, até 2.2 vezes mais propensas a investir em soluções inovadoras do que as empresas com mais tempo de mercado, de acordo com report da Oracle de 2019.
Fundada em 2012, a assessoria de imprensa e agência de comunicação IDEIACOMM é uma empresa de São Paulo que se adequa neste perfil. Com 18 clientes em sua base – a maioria do segmento de tecnologia e de startups – a empresa investe, hoje, cerca de 10% de sua receita em recursos tecnológicos, incluindo soluções da RD Station, On The Go, Knewin, Press Manager, além do software de organização Monday.
“A tecnologia é um caminho que nos dá fôlego para corrermos atrás de novos mercados. No passado, todos os nossos clientes surgiam a partir de relacionamento, de meu networking. Essa estratégia funcionou no início, mas, a medida que a agência foi crescendo, vimos a necessidade de implementar soluções para aumentar nossa eficiência. É um passo fundamental para sairmos da inércia e reduzirmos o esforço na conversão, abordando quem, de fato, está interessado em contratar os serviços de uma assessoria. Vale reforçar que a pandemia acelerou nosso processo de digitalização. Somos uma agência de pequeno porte e, no início, ficamos com receio, pois ainda dependíamos muito do modelo de relacionamento tradicional para ofertar nossos serviços. Mas o fato é que estamos conseguindo avançar, captar novos leads e converter clientes. Além disso, hoje conseguimos tocar muito mais reuniões com prospects e reduzir custos, uma vez que não há a necessidade de deslocamento”, explica Juliana Garcia, fundadora e diretora de relações públicas da IDEIACOMM.
Rui Aviz, diretor de vendas da Meetime – uma das principais salestechs de Inside Sales do país – comenta sobre essa mudança de percepção das empresas, que fora impulsionada pelo contexto atual do mercado.
“Eu diria que o grande desafio do nosso mercado no Brasil é justamente a maturidade para adoção de tecnologias de vendas. Muitas empresas não têm uma equipe de prospecção interna para tirar valor de ferramentas. Para sanar esta questão, a Meetime sempre educou o mercado com o marketing de conteúdo sobre adoção de insight sales.
Com a pandemia, praticamente em todas as empresas o vendedor não podia mais visitar o cliente, e querendo ou não isso deu uma acelerada muito grande na maturidade do mercado. Há empresas que falavam antes “não posso fazer vendas de modo remoto, no meu caso eu tenho de ir lá, conhecer o cliente” e que depois me disseram que suas vendas aumentaram. Então eu acho que, no médio prazo, uma grata surpresa será uma evolução concreta do mercado em termos de inovação. Claro que alguns clientes pequenos sofreram com a crise e também sofremos com esse impacto no começo, mas em termos de vendas para novos clientes, a nossa demanda aumentou”, explica Aviz, acrescentando que o ticket-médio da Meetime para pequenas empresas é de R$ 1,5 mil/mês para pequenas empresas e R$ 15 a R$ 20 mil para grandes organizações.
O diretor aponta ainda que o processo de tomada de decisão nas empresas para adesão de novas tecnologias varia conforme o porte da organização – em PMEs e startups, geralmente, a Meetime lida diretamente com CEOs e proprietários; enquanto em grandes empresas, essa tomada de decisão é conduzida por gerentes das áreas de vendas e marketing.
Ricardo Lopes Corrêa, CEO da Ramper – startup que oferece uma plataforma de prospecção digital para o mercado B2B e já atende mais de mil empresas – por sua vez, reforça a visão de que os novos players que surgem no mercado estão mais familiarizados com o uso de recursos tecnológicos e com a necessidade de transformação digital.
“As empresas que surgiram nos últimos 5 anos já nasceram em uma “era digital” e estão mais preparadas para dar um passo real em direção a digitalização. Víamos, também, muitas grandes empresas demonstrando interesse em se aproximar de um ecossistema de inovação, mas poucas mudanças significativas estavam acontecendo de fato até pouco tempo. A pandemia escancarou uma realidade de que as empresas devem se concentrar em processos mais digitalizados – isso extrapola o metiê apenas das startups – e também aumentou o interesse por parte das grandes empresas em entender de fato o que é uma startup, pois ficou claro que as próximas ondas de crescimento virão de mercados mais inovadores”, comenta Corrêa, acrescentando ainda que há muitas oportunidades a serem exploradas no país e que a crise do coronavírus forçou um movimento antes restrito a uma “bolha de poucas empresas inovadores ou aquelas com grandes orçamentos para investir na área”.
Este movimento de digitalização das empresas mais jovens, de fato, impõe uma gradativa mudança de percepção geral das áreas de vendas no mercado, as quais, de modo cada vez mais incisivo, observam a importância da tecnologia e da integração com áreas de marketing para a otimização da performance de negócios.
Não à toa, no levantamento da Oracle citado a pouco, 76% dos líderes de pequenos negócios concordam que as tecnologias digitais estão redesenhando suas práticas e modelos de negócio; enquanto 51% deles indicam o interesse em investir em tendências mais disruptivas, como o uso inteligência artificial, por exemplo, pois acreditam se tratar de soluções que serão decisivas para o sucesso de suas empresas no futuro. Além disso, como principais fatores de decisão para uma nova tecnologia, as PMEs indicam, respectivamente: preço, facilidade de utilização e melhores históricos de customer service.
Por outro lado, trazendo a discussão novamente para o ambiente de negócios brasileiro, ainda existem lacunas importantes, as quais, em contrapartida, abrem muitas oportunidades para as MarTechs e as SalesTechs que souberem explorar estes espaços. Mesmo com pesquisas recentes indicando, por exemplo, que empresas com investimentos em tecnologia possuem mais que o dobro das receitas de companhias de posicionamento analógico; as áreas de marketing e vendas ainda precisam avançar em seu processo de digitalização – mesmo com alguns passos importantes dados em segmentos como o mercado de B2B ou no campo dos negócios digitais, como vimos no capítulo anterior. Sobre esta necessidade de avanço, um estudo realizado no último trimestre de 2019 com empresas do varejo brasileiro, foi constatado, por exemplo, 43% das marcas não contavam com plataformas de CRM para entendimento de seus clientes, enquanto 35% das empresas não dispunham de um canal online de vendas.
Para uma real mudança deste cenário, Bruna Sartori – gerente de marketing da Exact Sales, startup que desenvolveu um software de sales engagement (engajamento de vendas) com foco na prospecção e qualificação de leads que hoje conta com quase 15 mil usuários ativos – aponta a necessidade de que as startups auxiliem no processo de transformação cultural da mentalidade das empresas e profissionais das áreas de marketing e vendas.
“Eu acho que a questão cultural é muito forte. Acredito que estamos em um processo de abertura. Antes, para muitas empresas, era difícil ter visibilidade sobre os benefícios das novas tecnologias. A partir do momento em que elas constatam que precisam fazer mais com menos e que a tecnologia vai ajudá-las, os preconceitos começam a ser quebrados. Muito disso graças aos próprios negócios digitais. Organizações tradicionais viram que as novas empresas que estavam surgindo no conseguiam gerar resultados, mesmo com menos capital, e foram atrás de entender como. Por outro lado, a questão da adaptação cultural ainda é, sem dúvidas, uma questão importante. Quando falamos de empresas consolidadas, temos o desafio de ver qual o melhor caminho para nos adaptarmos a uma cultura. Como fazer a ferramenta ser bem usada e integrada aos processos daquela empresa, mostrando a importância da tecnologia para o gestor e contribuindo na capacitação do profissional também.
Com esse intuito, criamos, dentre outras coisas, a Academia Exact, incentivando a reeducação do profissional que antes não estava acostumado com a tecnologia”, comenta Sartori, acrescentando que, hoje, o principal foco da startup são empresas de médio e grande porte com vendas complexas, e que todo todo este processo de mudança deve ser conduzido de modo gradual, sem desprezar o conhecimento que foi gerado ao longo dos anos nas organizações.
Entrando nessa discussão, vale a pena analisarmos, por sua vez, o grau de maturidade das salestechs e martechs brasileiras para a construção de um diálogo mais assertivo e colaborativo com as empresas, que favoreça um movimento de transformação cultural em prol da inovação.
Para Mateus Pestana, cofundador e CEO da SenseData – uma das primeiras startups a trabalhar o conceito de gestão de Customer Success no país, que hoje conta com uma base aproximada de 100 clientes no mercado de grandes empresas e espera um crescimento de 60% para 2020 – nos últimos dois anos, foi possível enxergar uma evolução importante do ecossistema de tecnologia brasileiro.
“Eu acho que o mercado de inovação no Brasil, em geral, vem se desenvolvendo bem. Ele ganhou bastante maturidade nos últimos 2 anos. E um conjunto de fatores contribuiu para isso. Hoje você já tem um ecossistema de second time founders que trazem uma dinâmica importante para o mercado, porque são empresas com potencial para escalarem mais rápido e já contam com uma independência financeira maior. O segundo ponto é a disponibilidade de dinheiro. Quando a gente começou a empreender não se falava no mercado em aportar dinheiro em alguém que não tivesse receita. Hoje, com mais e mais casos de êxito dos negócios digitais, você começa a atrair capital e bons investidores. Além disso, hoje há uma disponibilidade relevante de mão de obra qualificada. Pessoas muito boas querendo trabalhar em startups ao invés de multinacionais. Com tudo isso, vejo as startups mais estruturadas, endereçando realidades do mercado brasileiro e com uma compreensão maior de que a transformação digital, na verdade, é uma transformação social que leva em conta que as pessoas estão consumindo diferente, com expectativas diferentes e tendo provas de que é possível trazer outras abordagens para diferentes desafios que elas vivem no seu dia a dia”, diz Pestana.
O cofundador da LAHAR, Rodrigo Tucunduva, acrescenta que a competição com softwares internacionais tem impulsionado uma evolução do mercado brasileiro de startups.
“Entendo que, nos últimos anos, por conta da influência de soluções estrangeiras de marketing e vendas que enxergaram no Brasil uma oportunidade para abrir mercado e ampliar seus negócios, isto forçou as soluções brasileiras a evoluírem mais rapidamente e a termos um padrão de software muito melhor que antigamente. Isso foi bom para acelerarmos e desenvolvermos alguns pontos que, talvez, não déssemos tanta atenção sem esse tipo de concorrência. Além disso, o cenário totalmente atípico que vivemos hoje abre algumas oportunidades. Vemos muitas empresas precisando reinventar suas ações marketing e a forma que precisam vender. Isto vai de encontro com soluções como a LAHAR que auxiliam nesses processos”, analisa Tucunduva.
Todo este contexto dos negócios digitais, por sua vez, tem tudo para contribuir com a performance das empresas no mercado que, como temos visto aqui, gradativamente vem percebendo a importância da tecnologia para as áreas de marketing e vendas. Não à toa, segundo dados compilados pela Brainshark, já em 2018, 54% das empresas implementaram novas metodologias de vendas, enquanto 75% redesenharam o foco de suas estratégias comerciais. É um passo importante para o futuro.
Rock Content – A startup mineira Rock Content é uma das principais plataformas de marketing digital da América Latina, fornecendo soluções para o desenho de estratégias e automação de conteúdos. A Rock Content recentemente fez a aquisição das startups ScribbleLive e iClips.
Followize – Fundada em 2014, a Followize é uma startup paulista que desenvolveu uma solução para a análise e organização de leads, focada no aumento da produtividade de times de venda. Atuando especialmente no mercado automotivo, a startup conta com mais de 140 clientes.
Ace Turle – A plataforma indiana Ace Turtle oferece um conjunto de ferramentas para que marcas possam oferecer uma experiência fluida e omnichannel entre canais online e offline para os seus clientes. A startup já acumulou US$ 8,9 milhões em investimentos.
Leadfeeder – A Leadfeeder é uma startup finlandesa focada no mercado B2B que consegue mapear empresas que estão visitando o site de uma determinada companhia, mesmo que não preencham formulários. A startup já recebeu mais de € 4 milhões em aportes.