Analisamos a necessidade de mudança dos profissionais da área de RH, dos quais agora se demanda conhecimento em práticas relacionadas a dados e analytics
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Com o surgimento de novas tecnologias e a utilização dessas nos processos das empresas, tornou-se praticamente necessário o desenvolvimento de novas habilidades para os profissionais do mercado. De acordo com Josh Bersin – pesquisador da área de Recursos Humanos e tecnologia –, em artigo publicado no portal Forbes em dezembro de 2017, a alfabetização em dados e analytics se tornou um imperativo para os profissionais de RH.
Isso porque, no cenário atual, no qual People Analytics já está incluída como uma prática a ser desenvolvida pelas empresas, o poder de análise nem sempre se resume em gestores da área interpretando dashboards, buscando entender os motivos pelos quais, por exemplo, um funcionário pode deixar a companhia. Também pode ser representado por outros integrantes do departamento, que apresentem à liderança pontos de enviesamento, práticas ruins de trabalho, cultura falha ou outros problemas que possam ser provados a partir dos dados.
Na publicação, Bersin apresenta alguns insights sobre a prática de People Analytics, resultantes de uma pesquisa realizada em parceria com a Deloitte. Segundo o levantamento, um dos fatores mais importantes que pode predizer o sucesso da metodologia não é apenas as habilidades da equipe específica de analytics, mas as dos integrantes do time de RH de forma geral.
Da mesma forma como feito no estudo da PwC, as empresas foram categorizadas em quatro estágios da prática, e aquelas que se encontravam no nível mais avançado da metodologia contavam com um time de RH mais preparado. Nessas, 63% dos profissionais de RH possuíam um conhecimento forte em analytics, contra 20% apresentados nas companhias que se encontram no primeiro nível, mais básico.
Não coincidentemente, 90% das empresas em níveis mais avançados de People Analytics acreditavam possuir dados precisos relacionados a pessoas, o que também impacta no nível de segurança dessas informações: 95% acreditavam possuir práticas robustas de privacidade de dados. Assim, segundo Bersin, apesar de essa parcela representar uma minoria quantitativa em relação ao todo, seria esse o padrão de excelência da prática.
Ou seja, além do desafio criado em relação à estruturação e correto tratamento dos dados, tornou-se mais do que necessário que os profissionais de RH estejam familiarizados com assuntos e práticas que envolvem analytics.
De certa forma, é um abandono pelo menos parcial da tomada de ações e decisões baseadas em feeling e achismo: algoritmos, inteligência artificial e machine learning envolvem análises baseadas não apenas em dados, mas em matemática e estatística.
Segundo o estudo Leading the social enterprise: Reinvent with a human focus – do qual, do total de respondentes, 63% eram da área de RH –, a utilização de tecnologias cognitivas, inteligência artificial e robótica para automação de processos está em crescimento, estimulando uma redefinição das funções, que agora devem ser mais data-driven e estão mais empoderadas por conta da evolução das máquinas.
Conforme os resultados do levantamento, 81% dos entrevistados previam um aumento na utilização de I.A., 80% em tecnologias cognitivas e 64% em robótica. No entanto, apenas 26% dos respondentes afirmaram que a empresa em que trabalhavam estava preparada ou muito preparada para lidar com os impactos dessa tecnologia e só 6% consideravam a companhia em questão muito preparada. Tais números sugerem que as empresas estão começando agora a entender a necessidade do preparo de seus líderes e colaboradores – não só da área de RH, mas principalmente dela.
Na Vedacit, empresa brasileira do segmento de construção civil, os desafios em relação a People Analytics são justamente a organização de dados a serem analisados e a preparação de gestores e colaboradores para a mudança de processos, problemáticas comuns no estágio básico da implementação. De acordo com Elizabeth Rodrigues, líder de Gente e Gestão na companhia, o assunto é visto como pauta emergente na empresa, visto que pode tornar as tomadas de decisão mais analíticas e assertivas.
“No atual momento estamos buscando as informações e maneiras de como trabalhá-las por meio de soluções tecnológicas, já que não as possuíamos de maneira estruturada. Queremos mais consistência em nossas ações, ter dados factíveis e sólidos para isso e gerar mais valor para o negócio como um todo. No futuro, isso pode nos ajudar a perceber eventuais ineficiências de processos. Mas ainda estamos em um nível básico, um trabalho que antes de tudo é de mindset, não de tecnologia, porque as equipes ainda não têm esse olhar analítico. É algo muito novo”, conta Rodrigues.
Conforme dados do estudo de 2017 da PwC – feito em 79 países e resultante de 1379 entrevistas e 2900 questionários online – citado anteriormente, os três principais viabilizadores para a evolução do People Analytics estão ligados justamente ao mindset e/ou conhecimento dos profissionais a respeito da metodologia.
Os resultados do levantamento mostraram que 59% dos respondentes acreditam que o desenvolvimento de cultura organizacional em People Analytics é o aspecto que mais viabiliza a prática, seguido do comprometimento dos gestores da empresa (43%), e capacitação dos colaboradores envolvidos (40%).
No entanto, de acordo com informações publicadas – também da PwC, mas registradas em 2016 – no portal BlogRH, apenas 21% das empresas diziam estar fazendo ou já haviam feito uma mudança cultural para essa adoção.
Isso porque a visão por parte da alta liderança é a de que, de alguma forma, a área de RH ainda não está preparada para grandes transformações – muito por conta de ter sido, por tanto tempo, vista como área de suporte e backoffice das empresas.
Esse é um dos resultados obtidos pela pesquisa 20th Global CEO Survey, de 2017, realizada em todos os continentes; em 2015, 64% dos CEOs entrevistados tinham essa impressão, número que permaneceu praticamente estável dois anos depois: 60% deles afirmavam estar repensando as atuações de RH dentro da empresa.
Um possível problema dentro dessa questão, conforme análise do estudo, é que não necessariamente as habilidades e profissionais procurados pelos cargos de alto escalão sejam extremamente difíceis de achar, mas sim pelo fato de que os CEOs estão esperando encontrar profissionais completamente familiarizados com as habilidades que as organizações demandam não só no presente, mas também para o futuro.
Em outras palavras, estão à procura de profissionais perfeitos. A resposta, talvez, seja formar essas pessoas, uma solução mais acessível do que simplesmente encontrá-las.
A Nestlé, por exemplo, possui uma equipe global de People Analytics, distribuída em quatro grandes centros: Londres, Kuala Lumpur, Dubai e São Paulo, além da equipe corporativa, estabelecida na sede principal, na Suíça. Segundo Fabricio Pavarin e Fabio Alfieri, respectivamente Head de People Analytics para LATAM e Gerente de RH na empresa, atualmente a Nestlé está em um momento de transformação da área de Recursos Humanos.
Contando tanto com iniciativas básicas quanto outras mais avançadas, encontra-se em um nível intermediário da prática no Brasil, enxergando o desenvolvimento de habilidades analíticas por parte do profissional de RH como próximo passo essencial.
“Estamos desenvolvendo um plano de capacitação para os profissionais de RH da Nestlé, justamente para gerar uma comunidade data-driven. Atualmente, grande parte das tomadas de decisão são feitas baseadas em dados, mas o grande desafio é que, apesar de existir a consciência geral do time de RH sobre o quão relevante é trabalhar com esses insights gerados pela área de People Analytics, existe uma jornada de aprendizado para saber como extrair e utilizar a informação de maneira mais efetiva. É um ponto de maturidade que queremos alcançar a partir de plano de desenvolvimento e capacitação”, contam Pavarin e Alfieri.
Além disso, de acordo com os executivos, visando a mudança de mindset de uma empresa e a transformação dos processos, as HR Techs e startups especificamente de People Analytics são importantes alavancadores dessa cultura digital.
“As startups vêm com velocidade e mentalidade diferentes de uma empresa tradicional. Quando a empresa quer gerar agilidade, elas podem ser muito importantes na criação dessa cultura ou desse tipo de conhecimento mais rapidamente do que se fizéssemos isso 100% internamente”, afirmam.
Segundo Alessandro Garcia, CEO da startup Solides, durante muito tempo a área de Recursos Humanos esteve à parte da digitalização e automatização que acontecem em outras áreas. A partir da prática de People Analytics, a Solides busca oferecer processos simples de automação, que não demandem uma grande preparação por parte da empresa cliente. Hoje em dia, conta com mais de 1500 clientes, principalmente pequenas e médias empresas.
“Na parte de atração e recrutamento, o People Analytics consegue predizer o sucesso do candidato caso ele seja o escolhido para a vaga, a partir do desempenho dele no processo. Para o desenvolvimento, por meio de uma análise preditiva, é possível entender o que é necessário desenvolver nos colaboradores, criar um PDI (Plano de Desenvolvimento Individual) assertivo, com o objetivo de aumentar performance. Em relação à retenção, é uma análise a respeito do perfil das pessoas que saem, os motivos dessa saída, para conseguir identificar ações para trabalhar na retenção. Estamos buscando fazer tudo isso sem demandar, por exemplo, um time de cientistas de dados nos nossos clientes, até porque as PMEs nem sempre podem ou conseguem dar atenção a isso”, diz Garcia.