Entenda o cenário dos negócios de impacto social, conheça conceitos da inovação socioambiental e saiba como o segmento vem se fortalecendo.
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[dropcap]D[/dropcap]e acordo com informações de um relatório divulgado em 2019 pela ONU (Organização das Nações Unidas), a população mundial deve atingir o número de 9,7 bilhões em 2050, um crescimento de aproximadamente dois bilhões de pessoas nos próximos 30 anos. Segundo a organização, “as mudanças resultantes no tamanho, composição e distribuição da população mundial têm consequências importantes para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), as metas globalmente acordadas para melhorar a prosperidade econômica e o bem-estar social ao mesmo tempo em que se protege o meio ambiente.”
Em linhas gerais, negócios de impacto social são entendidos no Brasil sob dois conceitos. Segundo a Yunus Negócios Sociais – um dos principais atores do segmento –, trata-se de “empresas que têm a única missão de solucionar um problema social, são autossustentáveis financeiramente e não distribuem dividendos”. Diferenciam-se de ONGs (Organizações Não Governamentais) por não dependerem de doações ou incentivos filantrópicos e reinvestem o lucro no próprio negócio para ampliar o impacto gerado.
Por outro lado, de acordo com a Artemísia, uma das principais aceleradoras do segmento no Brasil, negócios de impacto social são “empresas que oferecem, de forma intencional, soluções escaláveis para problemas sociais da população de baixa renda”, independentemente se distribuem ou não dividendos entre acionistas. Além disso, julga necessário que tais empresas apresentem potencial de escala, possuam missão explícita de causar impacto social por meio de sua atividade principal e um modelo robusto de rentabilidade. Em definição similar, a Carta de Princípios para Negócios de Impacto no Brasil – elaborada pela Aliança pelos Investimentos e Negócios de Impacto – estabelece que “negócios de Impacto são empreendimentos que têm a missão explícita de gerar impacto socioambiental ao mesmo tempo em que produzem resultado financeiro positivo de forma sustentável.”
A adoção de conceitos e ideias pelo mercado ao longo das últimas décadas culminaram com o desejo e necessidade de um posicionamento mais “responsável” por parte das empresas e organizações. Como analisado no e-book Inovações e Impacto Socioambiental, realizado pela Wylinka em parceria com a Flourish, alguns movimentos foram protagonistas no desenvolvimento do Setor 2.5 – segmento no qual se encaixam os negócios sociais e de impacto, intermediários entre atores pro fit (segundo setor) e não profit (terceiro setor).
Entre esses movimentos estão o Capitalismo Consciente (propósito acima do lucro e orientação voltada para stakeholder), a criação do Sistema B (busca pelo benefício coletivo), a visão de negócio social proposta por Yunus (princípios voltados mais ao impacto gerado, menos ao lucro) e o surgimento da Aliança pelos Investimentos e Negócios de Impacto, iniciativa promovida pelo ICE (Instituto de Cidadania Empresarial) com a participação de diversos atores do ecossistema para “identificar, conectar e apoiar organizações e temas estratégicos para o fortalecimento do campo de Investimentos e Negócios de Impacto no Brasil.”
Atualmente, o ICE representa a diretoria executiva da Aliança e é referência dentro do ecossistema de negócios de impacto no Brasil. O Instituto foi fundado em 1999, a partir de uma iniciativa de um grupo de empresários em um contexto de revisão do papel da filantropia e de criação de mecanismos para a resolução de problemas relacionados à desigualdade social presente no país – sempre tendo como bandeira, a inovação social. Se no início o trabalho foi focado no fortalecimento da gestão de ONGs em âmbito nacional, hoje desempenha funções de forma mais integrada, com um olhar para todo o ecossistema de investimentos e negócios de impacto.
“O ICE trabalha muito em uma perspectiva de ecossistema quando olhamos para os investimentos e negócios de impacto. A estrutura do ecossistema que a gente adota é uma estrutura do fluxo de capital, pensando nos atores da oferta desse capital, nas instituições intermediárias – que ajudam esse capital a fluir, muitas vezes preparam e educam o mercado – e nos atores da demanda de capital. Existem também os dinamizadores desse campo, instituições que independentemente de estarem na oferta, serem intermediários ou empreendedores, ajudam no fortalecimento do segmento e ajudam na movimentação da agenda”, conta Fernanda Bombardi, Gerente Executiva do ICE.
No Brasil, é clara a evolução dos negócios de impacto nos últimos anos. São diversas instituições realizando trabalhos de aceleração e fomento de negócios no país, como é o caso das já citadas Artemísia e Yunus Negócios Sociais, além de Quintessa, BlackRocks, Impact Hub e muitos outros. Fundos voltados especificamente para negócios de impacto também têm adquirido maior importância e volume, dentro de um ecossistema que conta com mais de 1000 negócios, segundo informações do 2º Mapa de Negócios de Impacto, realizado pela Pipe Social.
Os investimentos de impacto em âmbito mundial e nacional, cujo volume tem registrado aumento significativo nos últimos anos, resultam em valores próximos a US$ 500 bilhões de ativos ao redor do mundo, gerenciados por mais de 1300 organizações. O Brasil, apesar de registrar números mais tímidos, tem se apresentado como um mercado próspero aos negócios e investimentos de impacto, com taxas de crescimento interessantes no último biênio. Naturalmente, existem desafios complexos que ainda atravancam uma evolução mais célere do segmento, muito por conta da incipiência da temática, cuja discussão ainda é inicial por aqui.
Existem desafios no segmento, tanto para a evolução do mercado de forma geral quanto para os negócios de impacto em si. Justamente por se tratar de um assunto novo, cujos conceitos ainda não foram totalmente absorvidos pela sociedade e pelo mercado, torna-se necessária uma transparência maior de informações, em um cenário de constantes atualizações que afetam o compreendimento acerca do segmento e suas particularidades.
As empresas, já guiadas pelo mote da transformação digital, também estão começando aos poucos a olhar para a inovação social e enxergar valor estratégico nos novos negócios que estão surgindo, presença que naturalmente atrai para o segmento atores de diversas categorias. O contexto de aquecimento do mercado é resultado da criação de um volume relevante de iniciativas nos últimos anos, acompanhada de um interesse crescente por parte das grandes corporações, que cada vez mais se inserem no ecossistema.
Por fim, negócios e startups de impacto socioambiental são importantes e necessários para o mercado e já têm gerado resultados de impacto expressivos em âmbito mundial.