Analisamos sobre o futuro da Internet das Coisas industrial e sua interação com outras tecnologias, que traz avanços e novos desafios para o setor
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Tendo em vista o estágio atual da capilaridade e utilização de Internet das Coisas na indústria brasileira, analisar e imaginar o futuro de suas aplicações se apresentam como um desafio. Cabe, portanto, entender como essa evolução pode acontecer de maneira geral e como essa progressão abre portas para tecnologias e discussões mais complexas do que as atuais.
Um próximo passo para a grande maioria – que já tem sido adotado em parte, mas ainda de forma incipiente – das empresas que já possuem seus processos e equipamentos minimamente conectados e digitalizados é a atribuição de mais inteligência àquilo que foi iniciado. Com o esperado crescimento expressivo de IoT globalmente, é viável esperar que sistemas e plataformas que atribuam inteligência à análise também registrem crescimento.
Segundo o estudo Future of IoT, realizado pela EY (Ernst & Young) em 2019, espera-se que o mercado de Internet das Coisas cresça de forma robusta ao passo que bilhões de dispositivos, serviços e sistemas se tornam mais conectados, resultado da diminuição de custos de sensores que transformam dados físicos em conteúdo digital.
Em relação a tamanho de mercado, de acordo com um levantamento realizado pela IDC, é esperado que gastos com IoT podem alcançar US$ 1,1 trilhão em 2023. A estimativa é que os segmentos de manufatura discreta, manufatura por processos e transportes sejam os maiores contribuidores desse crescimento, responsáveis por um terço do valor gasto em âmbito global.
Em termos de expressividade de mercado, existem estimativas que projetam números ainda mais impressionantes. Conforme dados da Accenture presentes em um post do Medium, espera-se que o IoT possa injetar US$ 14,2 trilhões à economia global em 2030. Além disso, em relação à geração de dados, espera-se que dispositivos IoT gerem, ainda de acordo com a EY, 90 zettabytes (90.000.000.000.000 GB) de dados em 2025, números que demandam sistemas robustos para análises de parte dessas informações.
Unir inteligência artificial à Internet das Coisas industrial representa um passo importante, necessário e pode ser um diferencial vantajoso em termos de competição. Como discutido em um post da Forbes, a grande quantidade de dados – informações que mudam constantemente – que tem sido gerada a partir de sensorização de IoT não são suportados por sistemas tradicionais de analytics ou BI (Business Intelligence). Nesse contexto entra a importância da I.A e machine learning, que podem, de forma assertiva, identificar padrões e alertar sobre condições anormais de sistemas e equipamentos.
A Schneider Electric, multinacional francesa que oferece produtos e serviços para gestão de energia e automação, com presença no Brasil, tem implementadas em suas fábricas e centros de distribuição iniciativas avançadas de IIoT, que permitem o monitoramento de diferentes variáveis, otimização significativa de processos e automação.
Para isso, a companhia se utiliza principalmente de uma solução própria de IIoT, chamada EcoStruxure, uma arquitetura de sistema aberta, interoperável e desenvolvida para segmentos como o industrial, de infraestrutura, data center e edifícios.
“Um ponto muito importante da aplicação de IIoT para nós é a eficiência do consumo de energia, possível a partir de um monitoramento inteligente, que nos mostra como podemos otimizar processos e como melhorar a utilização de recursos. Na área industrial, implementamos sensoriamento de equipamentos e softwares, que nos traz transparência por meio de dados e permite melhor gestão de eficiência dos processos. Dependendo da aplicação, os dados são gerenciados on premise ou em nuvem, de maneira que possamos medir performance, qualidade, eficiência energética e outros parâmetros do sistema produtivo”, conta Cássio Souza, Head of Operational Excellence da Schneider Electric South America.
De acordo com ele, a análise e tratamento dos dados captados podem, potencialmente, resultar em automação de sistemas e maior valor para todo um ecossistema industrial envolvido em uma cadeia de abastecimento, já que a integração de dados de diferentes fontes eliminam silos e permitem maior previsibilidade sobre desvios, alavancando oportunidades muitas vezes não exploradas.
Além disso, a Schneider Electric também tem unido Internet das Coisas a outras tecnologias em ascensão no mercado, o que tem contribuído efetivamente na produtividade e eficiência da empresa.
“Hoje nós utilizamos Realidade Aumentada, por exemplo, para fazer leitura de parâmetros de performance em processos e para otimizar procedimentos de manutenção de equipamento. É possível ter acesso a informações de chão de fábrica em dispositivos portáteis, como um tablet, e em ambiente de realidade mista, executar ações em equipamentos sem precisar acessá-los fisicamente, o que proporciona eficiência e segurança na execução de tarefas de manutenção”, afirma Souza.
Como analisado em um artigo acadêmico, por mais que possam ser adotadas separadamente, é exatamente a combinação de diferentes tecnologias que definem o mundo 4.0 na indústria, sendo elas: Big Data, Inteligência Artificial, Internet das Coisas, Realidade Mista (acesso a informações por meio de devices como óculos inteligentes e smartphones), Manufatura Aditiva (Impressão 3D) e Digital Twin (representação virtual de um objeto físico ou sistema, utilizando-se de dados em tempo real para análise e compreensão).
Conforme os autores do estudo, “A fusão destas tecnologias em um único ecossistema é altamente complexa, e exigirá além de pessoal qualificado e investimentos, que a indústria já tenha alcançado certo nível de integração. De nada adianta uma empresa, cujos processos são completamente manuais, querer adotar tecnologias da quarta revolução industrial instantaneamente”.
Em convergência a isso, de acordo com uma publicação da Forbes, o ápice do IoT industrial é representado justamente pela combinação de Inteligência Artificial, software e robótica, alavancando a indústria a um nível de automação total.
A Forsee é uma startup brasileira que une hardware e software para entregar uma solução de IIoT para o mercado, por meio de uma rede autônoma entre sensores e um gateway para transferir os dados coletados para a nuvem, que posteriormente são analisados e apresentados em um dashboard, com recomendações em tempo real.
Segundo Marcio Mariano, Engagement Director da empresa, a Forsee nasceu para ajudar tanto a indústria quanto o varejo, que compartilham do problema de gestão de estoques de forma muito semelhante: na primeira, em relação à matéria prima, e, no segundo, em relação a produtos para o comércio.
“Basicamente, a solução captura e concentra informações que já estão na cadeia de produção, e posteriormente aplicamos analytics e inteligência artifical sobre as informações e devolvemos prescrições. O IoT é associado diretamente às máquinas de contagem, para entendimento da produção, com sensores de predição de falhas e acionamento dos times de manutenção, para evitar surpresas durante o processo”, diz Mariano. De acordo com ele, a solução tem entregado um salto de performance de dois dígitos em indicadores como redução de estoque, aumento de produtividade e lucro a empresas de diversos setores e portes.
Focada em automação e robótica, a Automni desenvolveu uma solução voltada para plantas industriais, centros de distribuição e portos e aeroportos. O Rhino, principal produto oferecido pela startup, é um robô que transforma empilhadeiras tradicionais em autônomas, com um modelo de RaaS (Robot as a Service).
“Hoje o que nós temos como visão principal na Automni é o centro de distribuição totalmente automatizado, que resulta em vantagens não só de produtividade, mas de escalabilidade. A partir de uma logística mais flexível e acessível, que pode ser alcançada por meio de robôs, isso representa uma mudança significativa dentro desses processos. O Rhino basicamente é o motorista da empilhadeira e conta com um sistema de hardware e software, instalado em veículos homologados. Hoje, as empresas não têm mapeado o fluxo de materiais que ocorre dentro da fábrica. Pensando na logística disso, torna-se possível mapear esse fluxo e, posteriormente, reprojetá-lo, otimizando-o”, conta André Abrami, CEO e cofundador da empresa.
Além disso, a Automni está, no momento atual, desenvolvendo um equipamento para inventário automático, para leitura de etiqueta de produtos, relacionando isso ao estoque. A partir dessa tecnologia, segundo Abrami, é possível a identificação automática de produtos e sua localização e a quantidade de produtos que passa por um corredor de fábrica, por exemplo. Isso porque, por meio de IoT, o Rhino disponibiliza o que está transportando, onde e com qual velocidade.
“Em um processo manual, profissionais alocados em centros de distribuição perder muito tempo realizando a contagem de produtos. Se houver um sistema que leia a entrada de saída desses produtos, reduz-se o custo da operação. Com os dados de uma operação logística registrados, uma base histórica disso é criada, tornando possível fazer projeções sobre esses dados, o que pode ter um valor significativo para as empresas”, completa Abrami.
Por se tratar de um conceito diretamente ligado à criação e captura de dados, o IoT industrial carrega consigo desafios comuns a qualquer discussão que envolva a transferência dessas informações e análise sobre elas. Inicialmente, dois deles podem ser vistos como principais: a cibersegurança e privacidade desses dados e a existência de profissionais com know-how para tratá-los de maneira conveniente e estratégica.
Conforme informações presentes em um estudo da Deloitte, em 2013, um grupo de hackers invadiu os sistemas conectados de aquecimento, ventilação e ar-condicionado da gigante varejista americana Target para roubar números e informações de 40 milhões de cartões de crédito cadastrados.
Em 2016, um ataque da Mirai (botnet com foco em dispositivos IoT, que os ataca ao identificar falhas de software e configurações) tornou a internet inacessível em parte da Europa e Estados Unidos, causando um prejuízo estimado de US$ 110 milhões.
De acordo com um estudo realizado em 2017 pela Forbes Insights em parceria com a Hitachi, as empresas estão, de certa forma, conscientes sobre os riscos ligados ao IoT de forma geral. Entre as empresas com iniciativas bem sucedidas em Internet das Coisas, 37% delas acreditam que esta demanda mais atenção e segurança em relação a outras iniciativas de TI; 39% concordam que a violação de sistemas IoT pode ter consequências maiores em comparação a outras tecnologias.
Tendo isso em vista, 70% afirmaram possuir padrões de segurança mais elevados voltados para isso. Por conta desse preparo, 93% dessas companhias afirmam estar confiantes na manutenção dessa segurança em sistemas IoT. Com a estimativa para os próximos anos de um crescimento vultoso de sensores e dispositivos conectados, cada um deles representa um ponto de vulnerabilidade, que por sua vez representam novos pontos de atenção para a indústria.
Como decorrência desse crescimento expressivo, espera-se, também, uma preparação por parte dos profissionais para o desenvolvimento de novas habilidades, de forma que possuam competências para lidar com toda a transformação esperada. Isso, de forma direta, também envolve mudanças de cultura organizacional.
Segundo o estudo da Forbes, entre os maiores desafios na construção de capacidades em iniciativas IoT nas empresas bem-sucedidas com o conceito estão a cooperação entre departamentos (35%) e a disponibilidade de equipes preparadas (31%). Entre as empresas que obtiveram menos sucesso, o maior desafio é a falta de cooperação entre os colaboradores (48%). Relacionando essa preparação à cibersegurança, conforme informações de um levantamento da PwC, 35% dos respondentes viam já em 2016 a necessidade de treinamento dos funcionários no assunto.
Pensando nisso, em 2019, a ArcelorMittal Brasil lançou um programa de atração de talentos, em busca de profissionais que pudessem ajudar a alavancar conceitos de Indústria 4.0 na empresa. De acordo com Lucas Penna, CTO da companhia, não é possível dar passos rumo à transformação e inovação sem uma equipe de pessoas capacitadas.
“Nós temos trabalhado muito internamente com os colaboradores para inserir uma mentalidade mais digital em novos funcionários, visto que a Arcelor é uma empresa mais tradicional. E existe a necessidade de trazer para a organização pessoas que já possuam esse mindset, porque é uma maneira de acelerar a transformação, oxigenar internamente a empresa”, conta ele.
Em convergência a isso, segundo Cássio Souza, Head of Operational Excellence da Schneider Electric South America, pensar na transformação digital e indústria 4.0 incorre na questão de liderança e como os colaboradores podem ser maiores protagonistas por conta da adoção de tecnologias.
“A partir do momento em que existe um processo de transição, de transformação em curso, isso altera não só os processos internos de adoção, mas também como você aborda o mercado. Assim, também se torna necessário trazer a discussão para dentro de casa e promover o entendimento sobre o comportamento seguro que devemos adotar para proteger as operações e clientes contra desvios e danos causados por ciberataques Quando se começa a trabalhar mais com dados, as pessoas precisam entender como elas lidam com isso e quais são as tecnologias decorrentes, em todos os níveis da organização. A preparação e empoderamento dos funcionários é importante justamente por essas novas tecnologias atribuírem maior protagonismo aos profissionais dentro de uma empresa”, declara Souza.
Como analisado no artigo anteriormente citado, estima-se que, a depender da velocidade de adoção de novas tecnologias no mercado, entre 75 e 375 milhões de profissionais podem mudar de função e devem desenvolver novas habilidades. Além disso, “gestores devem trabalhar promovendo a agilidade organizacional dentro de um mundo de constantes mudanças. Eles devem se planejar para os efeitos do aumento da automação nos processos, resultante de tecnologias como a robótica, inteligência artificial, IoT, entre outros”.
Projetar a evolução do conceito e de iniciativas IoT na indústria não apenas surge como um desafio, mas também como algo minimamente arriscado, visto que variáveis e recursos inimagináveis podem ser desenvolvidos nos próximos anos. No entanto, sensores, Internet das Coisas e conectividade são os primeiros passos rumo à utilização de tecnologias mais robustas como inteligência artificial, robótica, manufatura aditiva e realidade aumentada e virtual, que surgem, sem dúvidas, para mudar completamente o cenário do segmento industrial.
A Livetrack é uma startup brasileira que oferece dispositivos IoT e uma plataforma de monitoramento inteligente de ativos e processos que geram informação em tempo real e oferecem insights para a tomada de decisão, em busca de maior eficiência operacional. Atualmente, possui foco em logística, cargas, frotas e ativos industriais.
Fundada em 2015, em São Paulo, a ROBBIOT oferece soluções de IoT focadas em segurança do trabalho, para verticais como mineração, óleo e gás e siderurgia. As soluções compreendem wearables, tecnologia LoRaWAN e inteligência artificial para predição de falhas e riscos no ambiente de trabalho.
A Sensire oferece soluções de monitoramento de temperatura para a cadeia logística e ambientes industriais, por meio de sensorização sem fio. A startup, fundada na Finlândia, disponibiliza dados de temperatura em tempo real e já captou mais de US$6 milhões em uma rodada de investimentos em 2019.
A Samsara une hardware, software e computação em nuvem para oferecer visibilidade em tempo real, analytics e inteligência artificial sobre operações na indústria, trazendo como resultados aumento de eficiência, segurança em processos e sustentabilidade à produção. Fundada em 2015, na Califórnia, a startup já captou US$530 milhões em investimentos.