Operações convencionais da área podem ser simplificadas por meio de tecnologia. Veja como o RH pode se tornar ainda mais estratégico dentro de uma empresa
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Muito tem se falado sobre a tendência de mercado que está fazendo com que o RH deixe de focar em atividades operacionais e se torne cada vez mais uma área estratégica. Entretanto, isso não significa que operações do RH, como processos administrativos, gestão de benefícios, folhas de pagamento, reembolsos, documentos, férias, faltas e desligamentos deixarão de existir.
Assim como é colocado por Idalberto Chiavenato em seu livro Como transformar RH: de um centro de despesa em um centro de lucro, o papel dos profissionais de RH não consiste mais somente no trabalho de departamento pessoal e de administração de processos. Eles são igualmente responsáveis por administrar os colaboradores de forma que os transforme em vantagem competitiva diante de seus concorrentes.
O que muitos estudos apontam como um RH estratégico consiste em uma área que realiza tarefas com foco em indicadores e em resultados, avaliação de impactos para as corporações e que propõe melhorias com base em dados e em estatísticas. E está se tornando cada vez mais necessário que as empresas compreendam a necessidade de acelerar os processos operacionais do RH.
Assim como foi levantado por Gabriel Vouga, Doutor em Administração de Empresas pela USP e Professor do Ibmec, as demissões e desligamentos também poderiam ser facilitados pelas tecnologias. “É preciso ter consciência do impacto nesses processos. As empresas muitas vezes precisam fazer mudanças grandes de estratégia, impactando diretamente a rotina da área de pessoas”, afirma Vouga.
Saiba o que Gustavo Leme, Head de RH do Grupo Baumgart, fala sobre o assunto:
Usamos as tecnologias para realizar atividades mecânicas, mas acreditamos que elas não substituirão a sensibilidade dos profissionais. Nos aproximamos do mundo de inovação participando de eventos que discutiam a temática e pesquisamos sobre as soluções internacionais. Refletimos internamente e iniciamos vários projetos, como a utilização de redes sociais para a formação da marca empregadora, testamos a admissão de pessoas por aplicativos, avaliamos realizar o processo de recrutamento digital e também fizemos um teste de robotização de folhas de pagamento. Um dos grandes gargalos dessa última atividade é que há muita operação de cadastros. Em um projeto, inserimos um robô para fazer o cadastramento, centralizando informações e processos. Foi muito positivo para nós, pois, além de reduzir os nossos custos, pudemos reforçar o nosso posicionamento como uma empresa que tem propósito digital e inovador.
Ele considera como uma questão importante, pois com as mudanças de comportamento e hábitos, não são só os processos de admissão que deverão ser transformados e acelerados. Os administrativos também precisarão acompanhar esse movimento.
O estudo Freelancing in America 2017, realizado pela Upwork e pela Freelancers Union, estima que a maior parte da força de trabalho americana (50,9%) será composta por profissionais freelancers em dez anos. Estima-se que em 2017 teremos 57,3 milhões de profissionais autônomos, um aumento de 8,1% em relação a 2014. E, assim como foi apontado por Mariana Dias, CEO e fundadora da Gupy, devemos analisar o quanto essas mudanças afetarão o modelo de trabalho brasileiro.
A questão é que, com freelancers o recrutamento e o “desligamento” precisarão ser ainda mais rápidos e a curva de aprendizagem precisa ser ainda mais precisa, pois a chance de errar precisa ser praticamente nula. Quanto precisaríamos investir em tecnologia e melhorar essas correlações?”, questiona Dias
Um levantamento desenvolvido em 2017 pela totaljobs.com mostra que o cenário de RH como uma área operacional está sendo invertido gradativamente. Ao analisarem a duração de determinadas tarefas dos profissionais de RH, identificaram que eles, em média, passam aproximadamente 22% do tempo em reuniões com os colaboradores em nível sênior e business partners.
Isso mostra que a área está passando a ser percebida como estratégica e que possa trazer outros benefícios além de redução de custos. Além disso, também passam 30% do tempo interagindo com outros colaboradores, engajando-os e solucionando questões relacionadas ao trabalho.
Muitas empresas têm dificuldade em tornar a área estratégica, pois boa parte desses dados que passam pela área muitas vezes ainda são inseridos manualmente, em papéis, e dificilmente conseguem ser analisados de forma ágil e em grandes quantidades. Assim, quando há a necessidade de encontrar determinadas informações para inferir boas deduções para uma tomada de decisões, é difícil encontrá-las ou estruturá-las.
A grande dúvida que surge, então, é: como fazer com que os processos burocráticos e operacionais deem espaço para assuntos estratégicos? Segundo a pesquisa Robotic Process Automation for HR and Payroll, da Ernst & Young, os processos realizados pelo RH poderiam ser automatizadas com softwares específicos. A pesquisa ainda estima que 65% dos processos poderiam ser otimizados a partir de tecnologias que poderiam reduzir os custos entre 50% e 70%.
Os HRMS (Sistemas de Gerenciamento de Recursos Humanos ou Human Resource Management Systems, em inglês) se tornam ferramentas importantes para a otimização da área e podem trazer inúmeros benefícios:
Por armazenarem dados, esses sistemas também permitem que os profissionais de RH monitorem e centralizem em uma só plataforma os dados de forma estruturada, podendo disponibilizá-los aos colaboradores em formas de relatório ou com recursos visuais.
Nos Estados Unidos, startups como a Zenefits já possuem em seu portfólio soluções como essa. Mesmo que seus clientes já possuam outros provedores e softwares, a plataforma da startup permite a integração de forma simples e rápida e, a partir do aplicativo, é possível administrar férias e licenças médicas, por exemplo. O administrador da plataforma também consegue fazer a gestão de benefícios, como seguro de vida, planos de saúde, odontológico e oftalmológico, benefícios de lazer e recompensas.
Fundada em 2013, a Zenefits participou de quatro rodadas de investimento, nas quais, no total, levantou mais de US$500 milhões. Atualmente possui mais de 10 mil clientes, mais de 50 parceiros da plataforma e foram realizados o processo de onboarding de mais de 500 mil colaboradores. Outras startups internacionais que apresentam soluções semelhantes são BambooHR, UltiPro e a APS (Advanced Payroll).
No Brasil, startups, como a Xerpa também prometem otimizar as tarefas dos profissionais de RH. Em uma plataforma única, os clientes da startup podem organizar todos os dados e informações sobre seus colaboradores, podendo analisá-los com base em números e estatísticas, também fortalecendo a cultura de inovação. A tecnologia da Xerpa faz leituras de holerites, organiza e programa os benefícios individuais para cada colaborador, registra faltas e férias, entre outros recursos.
A Xerpa conta com investimentos da Kaszek Ventures e da Redpoint Ventures. Um dos principais cases da startup é com a Lendico, fintech alemã que veio ao Brasil em 2015. O desafio enfrentado pela gerente de RH da Lendico era reduzir a quantidade de papéis, otimizar os processos e facilitar o acesso aos holerites. Após a implementação da Xerpa, os colaboradores da fintech passaram a receber notificações sobre a disponibilidade dos holerites assim que estivessem na plataforma.
E foi justamente por identificar que o RH tem tomado um papel cada vez mais central nas empresas que o Gympass, startup apresentada no post sobre engajamento, tornou-se cliente da Xerpa. Para Leandro Caldeira, Diretor Geral do Gympass, as inovações tecnológicas são fundamentais para todos os segmentos de negócio.
O RH está deixando de ser uma área de suporte e está atuando no core business das organizações. Vejo cada vez mais um perfil analítico, data-driven, moderno e que gera valor para o negócio. Para isso, o RH precisa estar atento às inovações tecnológicas e necessidades da força de trabalho, de diversas gerações e comportamentos”, diz Caldeira.
Aminadab Nunes, VP de Operations e People da CI&T, eleita dez vezes consecutivamente como uma das Melhores Empresas para Trabalhar no Brasil pela GPTW, acredita que há, de fato, espaço para soluções tecnológicas em atividades operacionais do RH. “É importante lembrar que, com a transformação digital, temos de pensar em novas maneiras de prestarmos contas e, consequentemente, em novas práticas de gestão”, afirma.
Saiba o que Thiago Campaz, CEO da VExpenses, fala sobre o assunto:
Antes de criarmos a VExpenses, trabalhávamos em uma grande consultoria e viajávamos muito. Tínhamos despesas para prestar contas à empresa para que pudéssemos ser reembolsados, fazendo um processo manual e que não gerava valor à empresa. A VExpenses, portanto, veio da ideia de criar uma forma para que agilizar esse processo de despesas de funcionários. A partir do uso da tecnologia, nós desburocratizamos e deixamos transparente o processo de gestão das despesas dos colaboradores. Em média, nossos clientes reduzem 88% do tempo gasto neste processo. As empresas estão notando que as novas tecnologias são imprescindíveis para acompanhar essas tendências nas relações de trabalho. As empresas ainda não estão acostumadas a modelos de assinaturas, armazenamento em nuvem, venda com menos contato corpo a corpo etc. O valor que as ferramentas entregam é indiscutível, porém, romper essas barreiras do mercado corporativo é ainda um grande desafio.
Além disso, o executivo aponta que a empresa procura soluções de mercado para inovar o back office. “Apesar de este mercado já estar consolidado, alguém pode trazer uma disrupção com tecnologia, oferecer uma maneira para que as empresas utilizem dados que já estão disponíveis de uma forma revolucionária”, afirma.
Apesar de ainda existirem lacunas tecnológicas para serem preenchidas, as empresas já estão reconhecendo a necessidade de inovar na área e estão fazendo planos para modernizar ainda mais. Segundo a pesquisa Harvey Nash HR Survey 2017, 60% dos entrevistados concordaram que a automação do RH é uma das principais preocupações da área no momento.
Em uma outra pesquisa, da Ernest & Young, a HR Technology Survey, 92% dos entrevistados também afirmaram que, entre 2015 e 2016, iriam efetuar diversas mudanças no landscape tecnológico da área de RH e 50% deles também afirmaram que iriam aumentar o budget para a implementação de tecnologias.
A utilização de tecnologias em atividades rotineiras do RH também é importante, pois podem dar aos profissionais o poder preditivo de tomada de decisões. Assim como foi levantado na pesquisa HR Technology Survey 2017, divulgada pela PWC em 2017, se é possível identificar que há uma tendência na taxa de desgaste dos colaboradores, por exemplo, é possível prevenir.
Se a taxa for reduzida de 10% para 1% em uma organização de 5 mil funcionários, é possível economizar US$ 3.75 milhões. O estudo ainda faz uma provocação: “E esse é apenas um dos vários usos de analítica preditiva”. Entretanto, só é possível realizá-la se houver dados estruturados.
É por isso que a digitalização dos documentos e dos dados dos colaboradores são tão importantes. Além de economizarem espaço físico, facilitar o acesso, agilizar a busca, diminuir a quantidade de impressões e a perda de informações, as tecnologias dão aos profissionais de RH o poder de conduzir decisões de negócios com mais embasamento.
Ao mesmo tempo, outro fator que preocupa as empresas quanto aos dados internos é a cibersegurança. A preocupação não é em vão. Empresas e governos sofrem mais de 22 mil ataques diário, que tem como objetivo o sequestro de dados e posterior pedido de resgate, de acordo com a OwlDocs, startup que faz a gestão segura de documentos. Internamente, 80% dos vazamentos de dados corporativos ocorrem por ex-funcionários. De acordo com um levantamento feito pela Kaspersky Lab, em 2017 as PMEs perderam, em média, US$ 64 mil em incidentes de segurança. O vazamento de dados internos, por exemplo, podem custar aproximadamente US$ 400 mil para as empresas.
Tecnologias como o blockchain podem certificar a autenticidade dos documentos, protegendo-os e reduzindo os custos com infraestrutura. A OwlDocs, que atua justamente com esse tipo de solução, surgiu em 2015 e atualmente conta com clientes como a Gradual Investimentos, Prevcom-MG, Morada Sul e OdontoGroup. A startup possui o Owl Docs Stamp, que é um contrato baseado na rede blockchain ethereum, que descentraliza o processo de auditoria e permite que os administradores da plataforma identifiquem quem realizou o registro e valide a integridade do arquivo.
Uma das vantagens da solução é o aumento da produtividade, pois permite a indexação por padrões, a pesquisa por termos genéricos, como CPF, nome ou valor, sincronia com a nuvem e Reconhecimento Ótico de Caracteres com apenas um clique.
Contudo, apesar de a área de RH estar se esforçando para inovar, ainda está longe do que outras áreas já conseguem inovar na forma de trabalho. Assim como foi notado pela Head de RH da Webmotors, Luiza Gomide, o RH não vem acompanhando esse movimento tecnológico na mesma velocidade.
“Há uma vontade genuína em inovar, mas há uma série de questões, como as burocracias trabalhistas, que se tornam barreiras para a adoção total das tecnologias na área”, afirma. Para Luiza, a questão mais difícil é fazer com que a facilitação do trabalho operacional e a inovação dos processos sejam, ao mesmo tempo, equilibrados com a realidade.
Ela explica seu argumento utilizando os controles de ponto como exemplo, que, de acordo com a CLT, são obrigatórios para empresas com mais de dez colaboradores. Assim, é possível fazer a seguinte reflexão: uma vez obrigatória, como é possível modernizar essa atividade, tornando-a menos morosa e burocrática para os colaboradores? Fábio Alessandro, doutorando na área de gestão de pessoas pela FEA-USP e coordenador do curso de administração da Strong ESAGS, também acredita que essas obrigações são um desafio para o RH e que, cada vez mais, a área enfrentará disrupções que chacoalharão o mercado.
A nossa legislação trabalhista é comprometedora em termos de produtividade. Eu acho que faz parte do futuro nós pensarmos e discutir as relações de trabalho de uma outra forma”, afirma Alessandro.
Assim, podemos perceber que há, de fato, espaço para a inovação da área de operações de RH, principalmente para entregar otimização e aumento de produtividade por conta das tecnologias. As startups podem ser importantes no desenvolvimento dessas soluções que poderão resolver as dores das empresas. A questão que deve ser ponderada ao criar uma nova solução é referente às questões trabalhistas e fatores burocráticos que podem dificultar a adoção das tecnologias na área.
A startup americana Gusto já levantou mais de US$170 milhões em investimentos. Sua solução consiste em uma plataforma com recursos como folha de pagamentos, benefícios, onboarding, entre outros para facilitar a gestão operacional do RH.
A Zenefits já levantou mais de US$500 milhões em investimento. Sua plataforma permite administrar férias e licenças médicas, gestão de benefícios, como seguro de vida, planos de saúde, odontológico e oftálmico, benefícios de lazer e recompensas. Possuem mais de 10 mil clientes e 500 mil usuários.
A VExpenses, startup brasileira, oferece uma solução para controle e prestação de contas para reembolsos corporativos. Com recursos como captura e preenchimento e funcionamento offline, a VExpenses almeja reduzir os gastos com prestação de contas em até 88%.
A startup brasileira Xerpa, que já levantou mais de US$1 milhão em investimentos, oferece uma solução completa para auxiliar na gestão operacional do RH, indo desde folha de pagamentos até controle de ponto. São clientes da startup o Nubank e o Gympass.